Gercino Nazário, um pragmático da arte de viver com a realidade
- Aderbal Machado

- 25 de ago.
- 3 min de leitura
Ninguém conheceu Gercino Nazário. Até muitos antigos, seguidores meus. Exceção, talvez, da gente do Braço do Norte, município da região de Tubarão, no sul do Estado.
Gercino era uma dessas pessoas cuja personalidade a gente admira sem embaraços. Semianalfabeto, muito inteligente no entanto, aberto, sincero ao extremo e amigo de todas as horas. Faleceu aos 70 anos há mais de três décadas, vítima de um infarto fulminante dentro do banheiro enquanto se banhava na sua casa no bairro Rio Bonito daquela cidade.
Na sua filosofia simplória ele me dizia: "Adebar (assim mesmo dizia ele, na sua linguagem cabocla). eu acho errado o homem viver só 70 anos (triste coincidência...), enquanto um elefante vive 150 e uma tartaruga vive mais de 400 anos". Para ele, a vida valia a pena ser vivida. E a viveu na plenitude, tantas as peripécias presenciou e vivenciou. Algumas em segredo a mim e, portanto, guardadas a sete chaves cá dentro.
Era muito meu amigo, até meio aparentado de forma indireta - embora não pareça pelo seu nome. Mas isto é outro departamento. Prefiro manter assim, em segredo.
Pois Gercino exibiu um pragmatismo estonteante num "causo" a mim revelado quando notei, numa das vezes que o visitei, máquinas do Estado rasgando suas terras pra implantar uma SC - rodovia estadual.
"Que negócio é este, Gercino? Ficaste mais doido?" E ele me contou. O Estado precisava abrir a rodovia de acesso a Braço do Norte (sede) e tentou negociar com outros proprietários num traçado mais distante. Como é natural, os donos, ao saber das negociações, levantaram os preços de suas terras, multiplicando-os por cinco vezes ou mais, tornando inviável as negociações. Em desespero, os técnicos do Estado resolveram mudar o traçado e negociar com outros proprietários e encontraram um traçado ideal: justamente passando pelas muitas terras de Gercino, pouco mais acima (ou pouco mais abaixo, sei lá). Narraram o caso a ele e perguntaram quando ele queria pelas terras ou quais compensações. Ele: "Nada". E os funcionários do Estado, espantados: "Como, nada?" E ele repetiu, enfático: "NADA, PORRA!, PODE PASSAR A MÁQUINAS E ABRIR A ESTRADA!!!". Assinaram o acordo e a estrada surgiu.
Minha estranheza se justificou e Gercino mostrou seu pragmatismo e inteligência: "A estrada passou, eu loteei as terras ao longo dela, vendi cada um lote por um bom preço e ganhei um dinheirão". Gercino, como todos nós, gostamos de ganhar dinheiro, mas até pra isso a gente precisa saber como, sem ganâncias.
Esta, pelo menos, foi a história a mim contada por ele mesmo, de viva voz e corpo presente, na sala de sua imensa cada rústica.
Em resumo, Gercino era negociante antes de tudo. Chegou a Braço do Norte sem nada e acabou dono de uma imensidão de terras e valores outros, como gado, apenas na base do escambo. De início, trocou ocupação de terra por trabalho de amanho da terra. Antes se dizia "agregado". Alguns proprietários resolveram delas se desfazer e ele, uma a uma, foi comprando. A maioria nos seus limites territoriais de propriedade. E assim se expandiu. Assisti ele trocando terra por gado, eucaliptos por gado e ia por aí. Um mestre.
Às vezes penso: que bom se tivéssemos, nesta vida, milhares de Gercinos espalhados por aí...
E que alegria a minha, ao ver, via internet, que Braço do Norte tem várias homenagens a ele, como demonstra o print anexo. Estou feliz.











Comentários